domingo, 29 de maio de 2011

Teia

Terminei um livro do Saint-Exupéry, "vol de nuit". Autor que admiro muito, não apenas pela sua biografia, mas sobretudo pela sutileza com que ele enxerga a vida. O livro em si é um pouco difícil de digerir no começo, mas o final justifica todo um enredo que antes parecia desconexo.

Enfim, o que quero compartilhar é que o livro coloca uma forte crítica a uma visão que defendi por muito tempo, de que as coisas carregam em si um sentido intrínseco que nos cabe enxergar, descobrir. Muito bonita mas pouco realista. Comecei a perceber isso conforme fui crescendo e vi a luta de cada um de nós, dia-a-dia, na busca de um sentido para este mundo. Essa questão no livro assume seu ápice na morte de um personagem; tema forte, mas que não chega a ser apelativo quando colocado pelas palavras de Exupéry. Quando é que começamos a sentir a perda de alguém? Aos poucos, quando percebemos que a dor não vem do fato em si, da morte, mas da teia de relações que deixam de fazer sentido para nós - o retrato na parede, o escritório vazio, o cachimbo que nunca mais deixou o criado mudo... São os sentidos que estão atrelados a cada um. Um sentido muito mais produzido do que intrínseco à cada objeto. E nesse processo criativo, nos tornamos então espécies de deuses, com o poder de dar sentido àquilo que tocamos, que criamos e que amamos? Não. Mas ao menos nos traz uma tranquilidade interior muito grande; não precisamos necessariamente nos tornarmos pessoas divinas que dizem compreender o sentido da vida para sermos alguém pleno interiormente. Somos todos humanos, cheios de sentidos, de relações; um ecossistema de dependências, causas e consequências. Mas ao mesmo tempo não somos livres de responsabilidades. Criar não se limita a produzir, mas a impulsionar essa grande teia para frente, que é a humanidade.

sábado, 14 de maio de 2011

La dentellière

"Il sera passé à côté d'elle,
juste à côté d'elle sans la voir.
Parce qu'elle était de ces âmes
qui ne font aucun signe, mais qu'il
faut patiemment interroger, sur
lesquelles il faut savoir poser le
regard.
Un peintre en aurait
fait autre fois le sujet d'un tableau
de genre. Elle aurait été

Lingère
Porteuse d'eau
ou Dentellière."

Foi mais que um filme, foi um sentimento de pureza que me fez querer voltar à escrever.
Homenagem àqueles cujos olhares são esquecidos todos os dias e que, cada qual à sua maneira, carregam uma história que acaba por se extinguir no infinito de nossas mesquinhas buscas pela normalidade.